Esta é minha primeira viagem para a Colômbia. Cheguei na última semana da campanha eleitoral para presidente. Mas, como o blog trata do tema de bebidas, vou deixar para eventuais oportunidades escrever sobre as eleições e também sobre a paixão dos colombianos em pela seleção nacional que, após a vitória sobre a Grécia, fez com que eleitores da oposição e situação comemorassem juntos nas ruas.
A Colômbia tem uma bebida nacional. É uma “aguardiente”, um destilado de cana com 26% de teor alcoólico e um acentuado sabor de anis. Outra bebida muito consumida por lá é o rum. A primeira detém cerca de 65% do mercado e o rum fica com os outros 35%. Esta é basicamente a produção nacional de destilados. As outras bebidas são em sua maioria importadas.
Existem quatro grandes “licoreiras” e todas pertencem ao Estado. Estranho? Sim, muito. O motivo remonta da chegada dos espanhóis. Antes deles havia um processo rudimentar de produção de bebidas. Com os colonizadores vieram os alambiques e o processo de destilação passou a ser desenvolvido sob as ordens e administração da Coroa. Com a independência, o Estado assumiu o que antes pertencia à Coroa e desde o ano de 1819 tem sido assim. E esta situação provoca diversas contradições. Como qualquer estatal, as “licoreiras” ficam ao sabor da política local, que escolhe seus gestores e que podem mudar a qualquer momento. E este pode ser um dos problemas que faz com que a “aguardiente” seja vista com certo desdém.
Nas conversas que tive nas licoreiras e com alguns profissionais que atuam na cadeia de comercialização de insumos, o que se percebe é que o produto não é tratado com orgulho. É uma situação muito parecida com a cachaça há cerca de 20 anos ou a tequila antes da década de 40. O produto chega a uma parcela da juventude e às camadas mais populares. Não é reconhecido como importante e a grande maioria não considera a “aguardiente” boa, mas muito forte, cujo sabor de anis impede a venda para exportação e a criação de misturas. As alegações, conforme os debates dos quais participei aqui, não me convencem e acredito que consegui ao menos colocar algumas dúvidas nos profissionais locais.
As características da “aguardiente”, ao contrário de serem fraquezas, são suas fortalezas. Para uma bebida crescer no segmento de destilados, ela tem que ter uma história e uma peculiaridade. No caso desta é uma bebida que remonta de mais de 30 anos, tem trajetória e história muito semelhantes à da tequila. O sabor confere uma personalidade que tem que ser apresentada. E o ritual de tomar (como possuem a tequila e a cachaça) deve ser criado. Neste caso, talvez o maior (e único) benefício de estar sobre a gestão do Estado é fazer com que este assuma sua responsabilidade e transforme a bebida em símbolo cultural. O governo mexicano fez isso. No Brasil, a cachaça foi incluída há mais de 15 anos como uma das prioridades de exportação e Fernando Henrique Cardoso fez um brinde nos 500 anos de descobrimento com cachaça. O setor batalhou na Organização Mundial do Comércio para que a bebida fosse reconhecida como brasileira. Ainda estamos aquém das potencialidades. Mas se há algo que podemos entender no processo da “aguardiente” é que ela tem muitas chances no mercado mundial. Basta ser o que ela já é: a bebida nacional da Colômbia.